Agora É que Estou Mesmo Confuso
(Luís Filipe Silva)
Agora é que estou mesmo confuso...
... pois se Michael Swanwick, com o Slow Life, nos tece um conto clássico, mas de FC pura e dura, e não é considerado como autor nessa veia, já Geoffrey A. Landis apresenta um conto romântico, perfeitamente banal, em At Dorado. E Landis é mais «duro» que os pregos...
Vamos por partes.
Slow Life é a história de uma exploração a um daqueles territórios sonhados e desejados pelos autores de FC e astrónomos em geral: Titã, uma das luas de Saturno, um pote de compostos químicos baseados no carbono mas em formas bastante diferentes que os da Terra. Falamos em territórios de metano. Falamos num satélite de um planeta maior. Falamos de baixíssima gravidade.
Uma expedição composta por três cientistas, duas mulheres e um homem (uma das diferenças subtis deste futuro, que nunca é tornada explícita), efectuam uma investigação abrangente da superfície, recolhendo amostras do terreno. De forma ligeira, Swanwick apresenta as relações entre os personagens, desenvolve comentários sobre a exploração espacial (financiada por uma certa NAFTASA, com sede em Toronto, com dinheiros públicos). A atmosfera narrativa assemelha-se à de The Very Pulse of the Machine (O Íntimo Pulsar do Mecanismo, in Paradoxo nº 1, série II, edições Simetria, tradução minha). Também aqui há uma protagonista feminina, também aqui um satélite emblemático (no caso daquele conto era Io, Júpiter). E como veremos, também aqui há um contacto imediato, feito por telepatia. E um perigo de morte. Será o final igualmente funesto?
É um conto despretencioso, e não fica na memória, embora seja divertido. Não introduz conceitos novos, e mesmo o contacto com o alienígena me fez lembrar o final extenso do Abismo do Jim Cameron, uma mistura de humanitarismo com soluções fáceis e lacrimosas.
O mesmo quase poderia dizer de At Dorado, que é uma história passada a nível de uma plataforma («doca») situada à saída de um wormhole por onde entram e saem as «naves» que viajam para longe no tempo e no espaço. Nesta plataforma, uma «empregada de bar» aguarda o regresso do seu «marinheiro», ao qual é fiel e do qual espera fidelidade, embora saiba que os marinheiros são famosos por ter «uma em cada porto».
Neste cenário, os «destroços» da nave em que seguia o seu marinheiro «dão à costa», e ela teme por sua vida.
A história pouco mais segue que uma banalíssima narrativa de desejo e saudade. Tema universal e que não se esgota, é verdade, mas que neste caso padece de uma grave falta de originalidade (mesmo o desenlace de FC é previsível), e de um tratamento estilistico de maior qualidade. Neste caso, o defeito do autor é revelado, e a sua capacidade de malabarismo limitada. O que não sucede com Swanwick, irónico por excelência, que sabe adaptar o estilo ao material e assim consegue produzir um conto de maior qualidade.
O único louvor a Landis é de ter tido a coragem de assumir designações verdadeiras: são marinheiros em porto seco à espera da maré. Mesmo a moeda de troca é o florim. Mas não é suficiente para salvar o conto. A não ser que tivesse sido uma short-short ou um poema...
Às vezes o truque não é dizer bem, mas curto. Razão pela qual esta crítica acabou.
(Ambos os contos podem ser encontrados em Year's Best SF, editado pelo David Hartwell - link para Amazon americana)
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