Na Trilha de Möbius

Notícias e reflexões sobre ficção científica, fantástico e literaturas alternativas.

domingo, julho 06, 2003

A Modesta Forma de Escrever o Presente

(Luís Filipe Silva)

Locus. A palavra indicia junção, aleph, confluência. O sítio em que se cruzam todos os caminhos. Passaram-se algumas décadas desde que o engenheiro Charles Brown deixou o emprego para lançar uma revista destinada a divulgar, observar, servir de memória para o género literário que estava a ter o boom nos filmes, nas antologias, que estava finalmente a chegar ao grande público. O mundo saía lentamente da Guerra Fria e descobria que era tão bom estar vivo e pensar no futuro. Sim, de repente esse futuro foi possível, e a ficção científica estava lá... Locus cresceu, mudou, transformou-se num sonho: é agora o jornal mais famoso a nível mundial sobre as literaturas fantásticas. Nele se separa o trigo (fantástico) do joio (literatura contemporânea, ou no jargão cá da casa, mainstream). Mas é uma separação pouco elitista, pois aos olhos da redacção a literatura fantástica é universal, e até um autor tão pouco subversivo quanto José Saramago encontra lugar na classificação.

O comentário serve de introdução a um assunto mais banal, que é a divulgação dos prémios Locus do ano. Atribuídos pelos leitores, é afinal um reconhecimento das melhores obras publicadas num período, mediante a classificação subjectiva que são todas as atribuições de prémios. Da lista completa, que aqui se pode ler, destaco desde já o fabuloso The Wild Girls, uma noveleta que apresenta Ursula Le Guin na sua melhor forma, alive & still kicking - e também o The Years of Rice and Salt, de Kim Stanley Robinson, uma obra de grande fôlego sobre como teria resultado uma Europa na forma árabe, tomando como pressuposto que a peste negra teria sido mais virulenta e fatal, desertificando todo o nosso continente.