Centésimo aniversário do pai do Big Brother
Isto de efemérides é assim. Não esperam que as coisas assentem, a poeira dissipe e as ideias se organizem. Chega ao calendário o dia marcado e elas aparecem, sem contemplações nem remédio. Uma chatice.
Vem isto a propósito de a Trilha de Möbius ter acabado de arrancar e passar-se no dia que se prepara para terminar 100 anos sobre uma data relevante para a FC: a data de nascimento de George Orwell. Novidade aqui pouca haverá. Orwell é bem conhecido fora dos círculos de aficionados pelo género, fruto de nunca ter sido um escritor de género no sentido de só escrever FC ou material relacionado ao longo da sua carreira, e por isso é dos tais autores que se recordam com frequência um pouco por todo o lado. Tanto assim é que a blogosfera portuguesa está cheia de notas alusivas à data (destaco, por exemplo, o Cruzes-Canhoto!), e que jornais nacionais também lhe fazem referência, veja-se como exemplo o artigo de Alexandra Dias Coelho no PÚBLICO de hoje. Mas porquê?
O facto é que Orwell escreveu 8 romances, mas só dois deles lhe garantiram a imortalidade relativa de se manter sob o olhar do público um século depois do seu nascimento. Desses 8 romances 6 são realistas e, dos restantes 2, Animal Farm é uma fábula fantástica e 1984 um romance de ficção científica. E, curiosamente, são precisamente estes dois trabalhos que lhe dão a fama.
Para a FC, 1984 fica como o marco mais relevante da distopia social e política, uma espécie de subgénero difuso em que os instrumentos da antecipação são utilizados para caracterizar pesadelos sociais possíveis caso o presente se desenvolva segundo determinadas linhas. Orwell não foi o primeiro escritor a escrever um livro desse género - basta lembrar Alexander Zamiatin e o seu Nós. Também não terá sido o que o fez melhor. Mas há um apelo especial na figura do "Grande Irmão" que ajudou, e muito, ao sucesso do seu romance, e que, nestes dias de videovigilância omnipresente, chega a colocá-lo na galeria dos visionários, juntando-se a um grupo muito restrito de pioneiros da ficção científica que, para além de escreverem boas histórias, conseguiram prever de forma correcta, ainda que parcial, desenvolvimentos futuros da sociedade ou da ciência (o que nunca foi o objectivo principal da FC, apesar do que surge com frequência na imprensa).
Orwell é, portanto, importante. Goste-se ou não, considere-se ou não que falta alguma ciência à sua FC. Uma consequência disso é continuar-se a reeditar as principais obras deste autor britânico. Nas livrarias online portuguesas pode encontrar-se neste momento uma edição de Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, da Antígona (1991), duas de O Triunfo dos Porcos, da Europa-América (ambas, de 1990 e de 1998) e várias edições dos romances menos conhecidos, saídos pela mão dos Livros do Brasil e da Antígona.
E sempre que for ao multibanco levantar dinheiro, sorria: o Big Brother está a olhar para si.
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